terça-feira, 16 de julho de 2013

Copa

O que é mesmo que atrai a gente. Um rosto familiar, nunca antes visto? Conversando chegamos à conclusão que paixão é como eleição presidencial - ou uma copa, se vc quiser, - só acontece a cada quatro anos. Entre ardentes paixões, fracamente correspondidas, encontramos algum amor que nos faça bem, depois que a paixão quase nos mata. Oras, onde está escondido o tesouro? Onde estará a porta que me dará uma nova saída?

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Serpente-mulher

Tiro a capa de chuva, o peso dos anos. Tiro de mim os lamentos e a auto-crítica. Estirpo um pedaço de coração gangrenado, que atrapalha o fluxo de amor e sangue. Desvisto a casca, por que sou uma serpente. Serpente-mulher.

E de uma hora para outra estou cercada de criaturas encantadoras. A música toca e todos se balançam, cada um a seu modo. A rua por onde a gente passa de mãos dadas também é encantada. A luz amarela dos postes, o cheiro de hortelã da última chuva.

Estou também eu encantadora no meu vestido novo.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

o começo e o fim do mundo

Estou lendo o Gênesis do Robert Crumb. É a história em quadrinhos da criação do homem e da a origem do temor a Deus. No Gênesis os primeiros homens vivem mais de 700 anos. Filhas desposam pais, homens escravizam e matam homens. Deus também mata, exige sacrifícios humanos. E quando, assustado, o homem teme a Deus, é aí que Ele distribui seu perdão.

Há um tempo recebi um email de uma amiga geóloga que mora em Minas e gosta de cristais. O email falava que em 2012 a terra inverteria rotação e giraria pro outro lado. Os espíritos evoluidos partiriam, guiados por estraterrestres, para a quinta dimensão. E os espíritos mais lerdos seriam lançados a um mundo árido, que lhes corrigiria os defeitos. Fiquei assustada e escrevi pra ela: - Mas, Maria, vamos todos cair da terra quando o mundo inverter o lado?

Da mesma forma que Deus matou todos os homens, menos Noé, num acesso de ira, o mundo inverterá sua rotação em 2012. Tudo isso é o plano divino. O plano divino é figurado. O concreto apenas é. Não tem planos.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

dinheiro

Nunca vi dinheiro comprar comida de mãe, conversa fiada com amigos ou sexo apaixonado. Dinheiro não pode calar palavras rudes e não promove a paz, bem ao contrário. Dinheiro não traz de volta a espécie extinta, não devolve a vida aos mortos.
Dinheiro é só dinheiro. Coisa inventada pra medir o preço, não o valor dos homens.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

O que me encanta no amor é a troca...

No primeiro dia trocaram telefones,
e um meio abraço na frente das crianças.
No dia seguinte trocaram torpedos, emails, saliva
trocaram a hora do almoço por um pulo no motel e juras de amor eterno.
No terceiro dia, lhe deu as chaves do apartamento.
No quarto dia trocou a langerie presenteada por um número menor.
No quinto dia, sem querer, trocou seu nome,
E no sexto a fechadura.

domingo, 7 de novembro de 2010

Ecobags e afins

Quem inventou a ecobag ou a campanha saco é um saco pode ter sido um intelectual, mas certamente não foi uma dona de casa.

Estou me preparando para ir ao supermercado. Semana passada, o Pão de Açucar não forneceu sacolinha plástica pra embalar minhas compras, mas três caixas de papelão. Foi prático transportar, mas aqui em casa as coisas ficaram mais difíceis.

Não sou muito fã de caixas de papelão, sempre acho que elas são bom abrigo para ovos de insetos e eu tenho pavor de baratas. Quem já fez mudança usando caixas de supermercado sabe que depois vai ser obrigado a dedetizar.

Moro num apê. Tenho pequenos cestos de lixo nos banheiros e um sobre a pia. Todos recebendo lixo não reciclável. Lixo que termina no lixão da estrutural ou num aterro. O nosso lixo úmido urbano não vai para compostagem.

Separamos aqui no prédio os materiais recicláveis: latas de alumínio, garrafas pet, papelão e papel. Mas eu nunca vi um caminhão 'seletivo' passar. É o velho problema do lixo separado na fonte e misturado no trajeto.

É claro que a dona de casa não quer ver sacos plásticos entupirem bueiros ou pararem no estômago de animais marinhos. Então a gente tenta se informar das opções. Encontrei num site a recomendação que compremos sacos plásticos oxibiodegradáveis. Já ouviu falar? Eu não. Por que então esses sacos não estão sendo usados para embalar as compras no supermercado? Até agora, acho que só o supermercado saiu ganhando em não fornecer a tão temida sacolinha...

É claro que o consumidor deve fazer a sua parte, mas qual a contrapartida? Cadê a obrigação da logística reversa? Quando os fabricantes vão ser obrigados a recolher pneus, pilhas e lâmpadas fluorescentes inservivéis? Quando os governos vão finalmente desativar lixões e instalar aterros sanitários e equipar a frota de coleta de lixo com caminhões seletivos? E as políticas para viabilizar a reciclagem? E o investimento em pesquisa e desenvolvimento?

Esse ano saiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos. É bonita e, se implantada, vai mexer no bolso de pessoas jurídicas e governos. Aí quem sabe, né? E nós, ambientalistas, podiamos parar que consumir tomate orgânico embalado em bandejinha de isopor e de comprar tecnologia descartável. Que tal?

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Amores finados

Não esperem ouvir-me fazer apologia do desapego. Eu amo tudo o que se pode tocar como uma beata ama a Deus. Amemos todos como quisermos.

Não esperem de mim que eu não sinta ciúmes ou medo. Eu os sinto e os declaro, sem nenhuma vergonha. Meu corpo é de carne, um dia se acabará.

Assim eu digo: jamais amei João como amei Pedro, nem Pedro como amei Carlos, nem Carlos como amei Roberto. Meu amor não flui. Ele nasce e morre, nunca é amor reencarnado. Sempre é novo. Como o novo sol de um novo dia.

Um amor finito é o que tenho. Qualquer outro amor ainda que seja maior, não é o meu. Meu amor é de carne e tem apego. É enterrado em cerimônia ou cremado quando morre.

E se, por um mero acaso, meu amor renascer, será sem nenhuma poesia: como renasce um corpo morto no estômago de uma formiga.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Pedra d'água

Meu amor é água cristalina
da pedra brota na pedra infiltra
mapa perdido da mina.

Suas botas duras pisam meu véu
enquanto ele pede chuva
às estrelas que caem do céu.

domingo, 17 de outubro de 2010

O relojoeiro ambientalista

No caminho da Chapada dos Veadeiros paramos pra almoçar em Formosa. Comida goiana e sobremesa numa dessas sorveterias tradicionais de cidade pequena, que vende até cigarros e aquele delicioso sorvete de limão que parece que você está comendo núvem.

Gente jogando dominó na praça da matriz. Dificuldade de dizer de quem é a preferência no cruzamento. Trânsito atrapalhado. Paralelepípedos. Calor. Movimento na rua do comércio. Menina de tenis no pé, carregando filho bebê. Estamos em cidade de gente altiva, mesmo que simples. Não há moribundos nos semáforos, velhos pedintes, bebados sem dente. Nada que denuncie pobreza de afeto.

Faz tempo que quero comprar um relógio de pulso. Então entrei na relojoaria só pra espiar, e uma figura simpatica me atende. Vejo um relógio pequenino, de metal e boa marca. Gosto dele, aponto. O relojoeiro abre a estante de vidro com chave e põe a pequena e delicada peça no meu pulso. Fica lindo. R$350. - Esse é ecológico, me diz o relojoeiro, vai durar anos. Quando riscar o metal, você manda polir.

Nesse dia eu conheci o relojoeiro ambientalista de Formosa.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Porcaria de diário

Querido diário,
Sinto-me como Avestruz Cabeça Enterrada. Eu que em fim via alguma coisa mais clara. E escolhi de novo o desconhecido. Agora terei que gastar quilos e quilos de energia pra me adaptar, pra abrir um espaço, pra respirar o ar fluido, de quem tem um metro quadrado de terra, que eu gaiatamente vendi... Continuo, me caro, ordenando o terrirório. Só que agora, não em 1:1.000.000, a proporção está invertida. Enxergo até as formigas do meu chão. Manja?