De acordo com o Houaiss, premissa é, por extensão, ponto ou idéia de que se parte para armar um raciocínio. Ex.: "partir de uma premissa falsa". Por que será que sempre que se fala em premissa é pra constatar que ela era falsa?
Imagino um bebezinho mamando no peito da mãe. Mesmo sem dentes e sem grande raciocínios, ele deve partir da premissa que o leite não acabará nunca. Quando a fome vem, ele chora, e logo tem um bico de peito metido em sua boca. Que mundo... Talvez seja esse o segundo melhor dos mundos, logo depois do quente e úmido mundo embrião.
De vez em quando, conto pro meu guri sobre quando ele nasceu. Desci do carro carregando você. Na mesma hora, bateu um vento e balançou de leve os seus cabelos. Você franziu a cara. Mas por quê? Ele pergunta - só pra ouvir de novo a mesma história. Por que você não sabia o que era o vento, eu digo. Ele ri muito e faz cara de quem não acredita. Meu guri ainda é pequeno e, como todo mundo, não se lembra de quando era um bebê. E parte, também como todo mundo, da falsa premissa de que nunca houve um tempo em que ele não sabia o que era o vento.
Pode haver premissa mais falaciosa de que achar que o tempo não passará? Que não aprenderemos? Que não nos tornaremos substancialmente diferentes do que somos hoje? Tenho visto muita gente argumentar que a essência de uma pessoa não muda. Discordo. Um embrião, vive num mundo perfeito. É perfeito por que é único. Só pode ser aquilo. Não depende dos atos de um embrião, o destino solitário e aguado do mundo em que vive.
Agora, saia da barriga e tome seu primeiro vento. Seja picado de pernilongo. Engasgue com osso de galinha. Leve choque em cerca elétrica. Caia de boca na quina da mesa. Vá pra escola e seja mordido pelo amigo. Faça cocô na calça e volte pra casa de cueca suja. Saia do jardim de infância e vá estudar numa escola sem parque... Em que redoma essa essência vai ter que ser guardada para não mudar frente ao mundo que a provoca?
E aí, mais uma vez, alguém pode argumentar: mas a criança muda, cresce, se forma como indivíduo. Daí pra frente, babau. Julgar-se velho demais pra provar algo tão inusitado como um primeiro vento na testa? Só pode ser também uma falsa premissa.
Ressaca do réveillon
Há 5 anos